Cara ou coroa? A pergunta faz parte do nosso quotidiano desde a infância, seja por causa dos jogos de futebol na rua ou por qualquer outro motivo em que se tenha que escolher algo. No futebol, é uma pergunta comum que o árbitro faz aos capitães de equipa antes de cada jogo para escolherem a baliza que pretendem atacar. Mas, outrora, houve eliminatórias de competições europeias a serem decididas com esse gesto tão simples. O Benfica que o diga.
Ainda não se recorria à marcação de grandes penalidades quando o Celtic visitou o Estádio da Luz a 26 de novembro de 1969. Jogava-se a segunda mão da segunda ronda da Taça dos Campeões Europeus e o Benfica tinha perdido por 3x0 na primeira mão, com golos de Thomas Gemmell, William Wallace e Harry Hood.
Vamos ao jogo!
É árdua a tarefa que os comandados de Otto Glória têm pela frente mas aos poucos vai tornando-se acessível. 35 minutos, Eusébio faz o 1x0 para o Benfica e o 1x3 na eliminatória. Apenas cinco minutos depois, John Fallon, guarda-redes do Celtic, é batido pela segunda vez, desta feita por Jaime Graça.
Chega o intervalo e a esperança da nação benfiquista é muita. Os jogadores regressam ao relvado para disputar a segunda parte. Nas bancadas do velho Estádio da Luz, 50 mil pessoas desesperam pelo terceiro golo que teima em não surgir.
Billy McNeill, dois anos depois de ter levantado o troféu da Champions no Jamor, venceu Coluna no «jogo» da moeda ao ar, na Luz
O tempo passa e nada. Não há unhas ou cigarros que resistam a tanto nervosismo. Período de compensação. O árbitro holandês Laurens Van Ravens tem o apito na boca. Está prestes a dar o término do encontro. Último lance do jogo. Diamantino Costa, que aos 62 minutos tinha entrado para o lugar de Raul Águas, cabeceia a bola. Ouve-se um apito mas, indiferente a tudo isso, o esférico entra na baliza defendida por Fallon. É golo. O tão ansiado golo do 3x0 que dá para empatar a eliminatória.
Lança-se a confusão no Estádio da Luz. Os escoceses reclamam que o apito do árbitro aconteceu antes do cabeceamento de Diamantino. Os encarnados, como é lógico, dizem que o apito aconteceu já depois da bola ter entrado.
Sem conhecerem a decisão de Laurens Van Ravens, que até decidiu a favor do Benfica, os adeptos presentes no Estádio da Luz invadem o relvado e obrigam a polícia a repor a ordem. Minutos depois, não muitos, com a situação sob controlo por parte das autoridades, as equipas regressam dos balneários, para onde o árbitro as tinha mandado aquando da invasão.
Joga-se um prolongamento mas os 30 minutos passam depressa. As contas da eliminatória estão na mesma. O recurso às grandes penalidades ainda não é deste tempo, portanto é a moeda ao ar que vai decidir quem segue em frente na competição.
Depois da invasão, o árbitro holandês recusa-se a lançar a moeda no centro do relvado e chama os capitães e treinadores de ambas as equipas ao seu balneário. Otto Glória não quer ver a decisão dramática da moeda ao ar e é Calado, o seu adjunto, quem segue com Coluna ao balneário do juiz. Do lado do Celtic, Billy McNeill é o capitão e o treinador é Jock Stein.
O momento decisivo
Os representantes de ambas as equipas e os árbitros juntam-se no balneário. A tensão e a ansiedade enchem aquelas quatro paredes. À porta, os jornalistas estão desejosos por informar os outros jogadores e a sociedade quem é o vencedor da eliminatória.
Chega o momento decisivo e as palavras de Billy McNeill, capitão do Celtic, na sua autobiografia, dizem tudo.
«Respondi cara, depois de Stein me ter dito que estava por minha conta. Saiu cara! Ainda estava a festejar quando Van Ravens me perguntou outra vez cara ou coroa. 'Agora é para decidir se és tu ou ele quem vai lançar. Ganhaste tu'. Disse novamente cara e lancei. A moeda voou, bateu no chão e rolou até ao pé direito do árbitro. Aí caiu e...cara! Foi o maior alívio da minha vida», escreveria, anos mais tarde, McNeill sobre o frente a frente com Coluna.
Tal como a moeda caiu junto do pé direito de Van Ravens, o Benfica caiu na segunda ronda da Taça dos Campeões Europeus e assim se conta a única vez que o Celtic saiu a sorrir do Estádio da Luz. Nesse ano, os escoceses acabariam por chegar à final mas foram derrotados pelo Feyenoord.
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