A carreira de futebolista por vezes passa por sítios inesperados. Se às vezes um agente pode levar um jogador a atingir aquele palco de sonho, muitas vezes o mundo do futebol e a falta de oportunidades leva-os a repensar a carreira, a pegar nas malas e a pensar num futuro longe de onde sempre sonharam. Foi um pouco isso que aconteceu com Chico Gomes, defesa português que joga na República Checa e que deu uma entrevista ao zerozero.
As subidas de divisão, a frustação de uma transferência falhada para a Primeira Liga, a desvalorização do jogador português e a vida na República Checa foram os temas desta conversa com Chico Gomes. Nos parágrafos abaixo pode ler a experiência de vida de mais um dos Portugueses Lá Fora.
ZZ: Conta-nos como tem sido a tua experiência na República Checa, a nível cultural e profissional?
Chico Gomes: A experiência tem sido muito boa. Cheguei em setembro, foi uma realidade nova, na segunda maior cidade da República Checa que fica muito perto de Viena, Bratislava, cidades importantes no panorama europeu. A nível futebolístico cheguei e adaptei-me com facilidade, comecei logo a jogar, entretanto veio um treinador novo que colocou jogadores da sua confiança nos primeiros jogos. Depois consegui ganhar a titularidade e até à paragem de inverno joguei os jogos todos.
ZZ: Porquê este regresso ao estrangeiro depois da experiência na Bulgária?
Chico Gomes: O meu objetivo depois da Bulgária foi continuar cá por fora, entretanto o clube teve uns problemas financeiros e acabou. Tive uma proposta vantajosa da Primeira Liga, em Portugal, que era o meu sonho, e decidi aceitar. Entretanto houve um problema entre treinador e presidente desse clube e acabou por não se concretizar. Acabei por rejeitar outras propostas de clubes estrangeiros, que eram vantajosas economicamente porque quis ir atrás do sonho, que acabou por não se concretizar. Depois assinei pelo União da Madeira nos últimos dias do mercado e conseguimos a subida de divisão. Continuei por Portugal à espera de uma outra oportunidade para vir para fora e surgiu agora. Decidi abraçá-la, estou feliz aqui e estou muito agradado com as condições da República Checa. É um campeonato com muita qualidade, bons jogadores e que, possivelmente, poderá abrir-me as portas para outros campeonatos.
ZZ: E um regresso a Portugal, passa pela tua cabeça?
Chico Gomes: Dificilmente, tenho contrato até junho de 2019. A Portugal voltaria se fosse para a Primeira Liga, mas penso que com a minha idade - já tenho 29 anos -, tenho noção que se depois das épocas muito boas que fiz em Portugal, duas subidas de divisão no Moreirense e no União da Madeira, e não fiquei na Primeira Liga, dificilmente irei lá chegar. Prefiro fazer carreira cá fora, jogar num nível um pouco superior à Segunda Liga em Portugal e quem sabe se surgirá alguma oportunidade. Às vezes é apenas uma questão de oportunidade.
ZZ: Noto alguma tristeza quando falas na Primeira Liga. Fica alguma mágoa por não teres conseguido chegar a esse patamar?
Chico Gomes: Sim, fica. Independentemente do meu valor ou o dos outros jogadores, penso que poderia ter tido oportunidades e que era merecido depois das épocas que fiz. Por onde passei joguei com regularidade, sempre com equipas, tirando a época passada no Cova da Piedade, a lutar pela subida de divisão. Fiz sempre mais de 80 por cento dos jogos, fica uma mágoa porque era um sonho e esteve perto depois dessa aventura na Bulgária. Por uma questão de "sorte" acabou por não se concretizar.
ZZ: Porque achas que há esta falta de continuidade nas equipas que sobem? Vemos, por exemplo, o Desportivo das Aves, que mudou praticamente toda a equipa, qual é, para ti, o motivo para isso?
Chico Gomes: Sinceramente, não sei. Já houve provas de que a continuidade deu frutos, lembro-me do Estoril do Marco Silva e agora o Portimonense, com o Vítor Oliveira. Geralmente, e isto são factos, quando há muita mudança há dificuldades em voltar a fazer bons resultados, porque os jogadores não se conhecem, é tudo novo. A prova disso foi o ano do Moreirense em que subimos, fomos todos embora, foram contratados jogadores desconhecidos e o Moreirense acabou por descer de divisão. É certo que essa continuidade é importante, porque os jogadores se conhecem. Às vezes os clubes pensam a nível de negócio, de oportunidade de vender alguns jogadores e valorização de outros jogadores, a verdade é esta. É um nicho tão grande que quando um clube sobe de divisão são muitos cães ao mesmo osso. Muitos empresários, muita gente a querer colocar jogadores e torna-se difícil para os que sobem de divisão com a equipa.
ZZ: Olhando para o futuro, o que gostarias de me contar daqui a uns anos?
ZZ: Não és o primeiro jogador a dizer-me isto, essa opinião é bastante comum. Há algum motivo para isto acontecer? Sentes que não se dá valor ao jogador português?
Chico Gomes: Os portugueses não têm noção da qualidade que nós temos. Temos o melhor jogador de futebol, futebol de praia, futsal, os melhores treinadores, somos campeões europeus de futebol e futsal, campeões mundiais de futebol de praia. No estrangeiro isto sabe-se e quando o jogador português é contratado e mostra o seu valor cá fora chama a atenção. É de agradecer a todos os outros jogadores portugueses que já jogaram fora do seu país e que abrem portas e continuam a deixar portas abertas para outros jogadores portugueses poderem emigrar e possívelmente fazerem carreira cá fora, conseguindo melhor estabilidade a nível familiar e financeiro.