A Taça da Liga tem um novo capítulo que se escreve numa carta transviada. O Benfica, dominador histórico da prova, parecia destinado à sua oitava final mas 45 minutos depois do primeiro envio a história mudou de destinatário. O Moreirense virou a desvantagem ao intervalo e com três golos a «sangue frio» reservou para si o último lugar na final de domingo, frente ao SC Braga.
Colado no canto direito, o selo do golo benfiquista começou por lá. Toto Salvio encostou e não estragou um cruzamento com olhos de Eliseu, que no regresso à competição depois da lesão mostrou que ainda está aí para as curvas... durante 45 minutos. Um golo tão madrugador inquinou naturalmente ainda mais a distribuição de forças já de si desiguais; e o Benfica, num ritmo pausado mas seguro, foi deitando um olho à coisa que mais tarde ia cheirar a esturro.
Por entre o controlo ritmado, a formação encarnada bem podia ter despachado o correio antes do transvio. Nos primeiros 45 minutos esteve uma mão cheia de vezes com o carteiro à porta, mas falhou sempre a entrega. Makaridze evitou-a duas vezes (a Jonas e a Salvio), Jonas falhou um chapéu (24') e Rafa Silva voltou a sofrer de vertigens quando viu a baliza pela frente. O Benfica falhou a decisão antecipada e viria a pagar caro pelo serviço.
O intervalo fez muito mal ao Benfica; e maravilhas aos cónegos, que depois de 45 minutos sem história no último terço do terreno regressaram transfigurados. Tão diferentes que em 10 minutos viraram o jogo do avesso; e o resultado. Dramé, que tinha acabado de começar o turno - que é como quem diz que tinha entrado ao intervalo -, contornou Ederson e fez o empate, isto depois de um passe açucarado de Francisco Geraldes.
Os quase 9 mil benfiquistas nas bancadas coçavam a cabeça com o ligeiro atraso na chegada à final, mas o pior estava mesmo por acontecer. Minuto 55, Livre estudado do Moreirense, bola em Cauê que fez chegar o cruzamento rasteiro ao pé direito de Boateng; cada tiro, cada melro e de repente o hegemónico Benfica ficava tão mais longe de uma final que já parecia fazer parte do léxico do clube.
E o que tremeu a equipa benfiquista nos minutos seguintes. Sem conseguir criar à frente - porque Inácio lançou Fernando Alexandre, qual tampão - abanou que nem papel ao vento lá atrás, caricaturando a organização defensiva tão elogiada por Pep Guardiola. Aos 65' Nildo podia - e devia - ter acentuado o espanto quando em posição central dentro da área atirou por cima; um minuto depois foi Ederson a a sacudir um remate cruzado de Boateng. Mas estava-se apenas a evitar o óbvio.
Jardel, catastrófico, perdeu uma bola na saída e Podence pôs em prática o ponto forte do Moreirense: velocidade, profundidade e Boateng acabou o trabalho, com o 3x1. Dizer por esta altura que o correio seguia com a morada cónega por engano seria falso; a equipa de Inácio fez 45 minutos soberbos e a última coisa que merecia era uma carta de dispensa antecipada.
Com o mal todo feito, o Benfica reagiu em desespero mas Makaridze fechou a loja e os postes ajudaram. É verdade que o Benfica podia ter recuperado os dois golos, mas Moreira de Cónegos não merecia ficar sem esta carta escrita a tinta dourada.
Dois momentos que escreveram a história do jogo. O extremo dos cónegos «bisou» na segunda parte com golos plenos de oportunismo e frieza. Ainda obrigou Ederson a uma ou outra intervenção apertada e saiu do estádio do Algarve como a grande figura do jogo.
É o rosto da desorientação defensiva do Benfica na segunda parte. Cometeu um erro imperdoável que originou o terceiro golo do Moreirense e nunca foi capaz de garantir que a equipa não abanasse nos momentos de maior aperto. Para esquecer, embora a sua culpa não morra solteira esta noite.